"Ser melhor que ontem". Essa ideia ficou na minha cabeça: talvez seja esse o superobjetivo de qualquer ator nessa peça a que chamamos Vida. Vai que Stanislavski estava fazendo filosofia o tempo todo e a gente sempre achou que era teatro?
Sério, gente. O mundo é diferente do lado de cá da quarta parede. Há mais esperança. Mais lágrimas, também, é bem verdade, mas é o preço de viver com alma. É o preço de viver sendo intensidade. O ator deve se entregar de tal forma ao seu teatro que não há outra saída senão ser teatro. Mas esse "dever" não é uma obrigação: ocorre naturalmente. A relação entre o teatro e o ator é um mutualismo. Um casamento feliz.
É isso: fazer teatro de verdade é ser teatro. Estar em cena é tornar-se a própria cena. É visceral! Tornamo-nos cenário, figurino, texto. Cada um se torna o elenco inteiro. Eu me tornei cada um de vocês e vocês se tornaram eu. E é só por causa disso que eu tenho conseguido, a cada dia, ser melhor que ontem. Porque, sendo mais vocês, me torno mais eu mesma.
Somos unidade porque compreendemos que cenário, figurino, texto e elenco tem o mesmo valor. É uma espécie de panteísmo sustentado por um deus chamado Palco. E é com esse amor quase religioso que eu amo vocês e tudo aquilo o que vocês somos.
Partimos do ponto zero - o nada - e voltamos à ele, mas voltamos cheios de nós. Cheios de nós desatados e, cheios, abarrotados, plenos de nós mesmos.
Pago o preço - as praias não idas aos domingos, o medo de nunca conseguir entrar no personagem, os não-posso-tenho-ensaio, o perfeccionismo desesperado, essa ansiedade furiosa e a espera que parece nunca acabar por finalmente ser a atriz que eu espero ser um dia - à vista e fico ainda mais rica: sou Cëna.