terça-feira, 10 de setembro de 2013

Simples

Sei que vai parecer clichê
E é clichê
Hoje o sol se esmerou
Em amanhecer
Brilhou sobre mim
O corre-e-corre cotidiano
E eu me lembrei
De quando eu tinha doze anos
E me sentia muito incapaz
Mas não mais
Deixei pra trás
Feridas que eu fazia questão de conceber
Teorias pré-fabricadas pra me enlouquecer
A fome, a quem eu fingia nem perceber
E o tédio de quem ando até hoje a correr

Sei que vai parecer clichê
E é clichê
A primavera se esmerou
Em florescer
Diferenciar cores:
Não sabia, hoje sei
E eu me lembrei
De quando eu tinha 16
E lia Baudelaire e Allan Poe
Mas não mais
Já acabou
O tempo de me aprisionar em livros bons
O medo de não satisfazer-me com quem sou
A ideia de que só o amor triste é amor
A idade de ignorar que o mundo me chamou

Sei que vai parecer sonhar
E é sonhar
Hoje a chuva me convidou
Pra trovejar
Foi quando aprendi
Que amor é só o que me move
E eu me lembrei que ontem tinha 19
Cheguei a duvidar que existe deus
Cheguei a duvidar que existo eu
Mas não mais
Já disse adeus
À morte que não consegue mais me amedrontar
À rima que não quiser ser pobre pra rimar
Ao mundo que não quiser ser grande pr'eu viajar
À tudo que já insinuou que é ruim sonhar

-  
(a quem interessar possa)

Há um mês fez vinte anos que o mundo me existe. À véspera, numa coxia, uma amiga de vinte e poucos me disse ter surtado na sua passagem de 19 pra 20, ao que respondi: pois eu tô achando o máximo essa história de duas décadas. E estava mesmo, até que deu meia noite. Em um segundo, vinte anos pesaram nas minhas costas, ainda que eu não me lembrasse de cada um deles. Pus-me a pensar: oras, vinte anos de quê? Então fiz-me o favor de ilustrar-me em coisas que me são desde que me entendo por gente. Ei-las: música, laços de fita para o cabelo, tintas com as quais escrevi por toda uma parede do meu quarto, o coração de pelúcia de alguém especial, cartas de outro alguém especial, o empoeirado livro das sombras, fotografias - a vó, a prima, a mãe e a melhor amiga; o teclado, a máscara do Zanni (que significa um universo), a Naninha que já secou muitas lágrimas minhas; Bob, o ursinho, idem; o curso de ling do Saussure, fones gigantes de ouvido, agendas e diário, esmaltes, chapinha, aquele batom laranja, a fita métrica com seus números cruéis e a barrinha de cereal, o bibelô de bailarina, o headband, a Hay Lin e um livro dado e recebido com muito amor. Por fim, penso que essa foto me fotografa melhor do que qualquer retrato do meu rosto. Fico feliz ao perceber que nunca deixei de ser eu. Mais feliz ao perceber que mudei tanto. E ainda mais feliz ao perceber que ainda hei de mudar um bom bocado. Hoje não mando beijos:

Um sonho,
Lu


Um comentário:

Obrigada pelo comentário! Vou ler, e depois publico e respondo, ta?