quinta-feira, 31 de outubro de 2013

Por quê?

Dia desses lotei uma página do meu diário com questionamentos direcionados à mim mesma. Não consegui responder nenhum. Parei pra pensar agora e tenho mais alguns pra coleção. Sem qualquer pretensão de alcançar conclusões definitivas, deixo aqui as novas perguntas e umas linhas de raciocínio sobre elas. Decerto a ninguém interessará essa bobageira de crise de menininha de 15 anos (embora eu já tenha aniversariado um tico mais que isso), mas vou postar assim mesmo.

Por que desativei meu facebook?
Por que criei uma página para o blog no facebook?
Por que meu perfil no blog não diz quem eu sou?

No dia em que desativei aquele troço, compartilhei uma imagem que dizia "EU ESCOLHI A BRUXARIA". E ta certo, escolhi mesmo, há uns quatro anos. Mas ainda não sou mais que uma neófita. Ainda conheço pouquíssimo para considerar a mim mesma uma bruxa, e o mais perto que já cheguei de uma dedicação foi no ano passado, tendo deixado a celebração da última lua cheia do ano pra lá. Ou seja: sou uma curiosa preguiçosa, por assim dizer, da bruxaria. E a preguiça tem sido mais praticante do que a curiosidade. Pois me diga: qual a necessidade de uma neófita compartilhar aquela imagem? Exibicionismo, concluí. Não consigo convencer a mim mesma que sou uma bruxa! Por que então essa necessidade de convencer/provocar os outros?

Vejo pessoas agindo tal e qual eu percebi ter agido naquele momento. Essas pessoas e eu, com essas atitudes desnecessariamente expositivas, me fizeram desativar aquele facebook cheio de gente falando quase sempre coisas que não vão fazer crescer a ninguém - nem a si mesmos, nem a mim, nem a qualquer um que leia.

Criei a página para o blog no intuito de (me) expor, de certa forma, mas já não se trata, aqui, de uma exposição gratuita de mim - "Luísa" -, uma exposição gratuita do meu ego. Nem sequer uma exposição do que penso, já que exclamo menos do que pergunto. Mas uma exposição do que crio ou experimento, do que acho que vale um tempinho da reflexão de outrem ou do que penso que pode alegrar o dia de alguém que está geograficamente distante de mim. Acho incrível essa potencialidade da internet - a de tocar à distância - e quero aproveitá-la.

Há gentes em excesso querendo mostrar o que criam ou experimentam, e isso gera uma saturação no buraco negro que é a internet que quase me põe claustrofóbica.

Sou indefinida e inacabada, como todos. Estamos sempre à mercê do dia seguinte: sujeitos a sermos berço de uma característica até então inédita em nós, e por isso não somos capazes de definirmos a nós mesmos. 

Eu não sou capaz de me definir. Essa perspectiva destroça a necessidade de um ego e a necessidade de exposição de qualquer coisa que eu seja, já que eu não sou "coisa" nenhuma, efetivamente.

Ta dando pra entender?

To achando que essa história de se individualizar, se nomear, ser o avesso do anônimo é que pariu o egoísmo. E isso ainda vai acabar destruindo nossa razão - se é que ainda temos alguma.


domingo, 27 de outubro de 2013

Instruções para Cortázar um mal

Preâmbulo às instruções para Cortázar um mal

Tenha um problema. Deixe-se levar por ele até que se esqueça qual o verdadeiro motivo de sua preocupação. Fique triste, imensamente triste. Desesperado. Perca a fé na humanidade. Perca a fé em si. Desacredite do deus que você acredita. Tenha canais lacrimais. Permita que seus canais lacrimais derramem pela sua face um verdadeiro oceano de tristeza salgada. Pense que não há saída, e procure uma.

Instruções para Cortázar um mal

Tenha um rosto embebido em gotas de água com sal e duas mãos. Na verdade, não são necessárias as duas mãos comuns à maioria das pessoas. Se não tiver mãos, use as mãos de outrem. Convém tratar-se de um amigo - convém ter um amigo, principalmente para Cortázar um mal, mesmo que você tenha duas mãos.
Se tiver as duas mãos, tanto melhor: deslize as mãos - ou a mão, caso só tenha uma; ou as mãos de outrem, caso não tenha mãos - sobre pele da sua face embebida em gotas de água com sal no intuito de afastar as gotas dali. Caso elas molhem suas mãos - ou sua mão, ou as mãos de outrem - e isso te incomode, enxugue suas mãos - ou sua mão, ou as mãos de outrem - na roupa que estiver vestindo ou em qualquer pedaço de pano que houver por perto, caso esteja nu. Tenha uma boca. Tenha consciência de que tem uma boca. Abra a boca para descobrir se você está vivo. Caso esteja, faça movimentos aleatórios com a boca. Jogue a língua para fora dos limites dos lábios como se quisesse ser desaforado com o mundo. Saiba o que é uma carranca e inspire-se nela. Depois de espantar os maus espíritos, perceba que é possível movimentar o canto esquerdo da boca para a extrema esquerda do rosto. Movimente. Faça o mesmo com o lado direito. Perceba também que é possível movimentar os dois cantos da boca ao mesmo tempo. Perceba por fim que é possível essa movimentação dos cantos da boca com um largo espaçamento entre um lábio e outro, até que se possa ver todos os dentes - ou toda a gengiva, caso você não tenha dentes. Realize essa movimentação. Finalmente, você acabou de dar um sorriso. O sorriso é o avesso do mal. Você acabou de Cortázar um mal com sucesso. Parabéns e boa vida. 




Por que eu estava triste, mesmo?
Lu


ps. Não entendeu nada? Dá uma lidinha nesse texto (ou em qualquer outro) de um cara chamado Júlio Cortázar:

"Preâmbulo às Instruções para dar corda no relógio 
Pense nisto: quando dão a você de presente um relógio estão dando um pequeno inferno enfeitado, uma corrente de rosas, um calabouço de ar. Não dão somente o relógio, muitas felicidades e esperamos que dure porque é de boa marca, suíço com âncora de rubis; não dão de presente somente esse miúdo quebra pedras que você atará ao pulso e levará a passear. Dão a você - eles não sabem, o terrível é que eles não sabem - dão a você um novo pedaço frágil e precário de você mesmo, algo que lhe pertence mas não é seu corpo, que deve ser atado a seu corpo com sua correia como um bracinho desesperado pendurado a seu pulso. Dão a necessidade de dar corda todos os dias, a obrigação de dar-lhe corda para que continue sendo um relógio; dão a obsessão de olhar a hora certa nas vitrinas das joalherias, na notícia do rádio, no serviço telefônico. Dão o medo de perde-lo, de que seja roubado, de que possa cair no chão e se quebrar. Dão sua marca e a certeza de que é uma marca melhor do que as outras, dão o costume de comparar seu relógio aos outros relógios. Não dão um relógio, o presente é você, é a você que oferecem para o aniversário do relógio.
Instruções para dar corda ao Relógio
"Lá bem no fundo está a morte, mas não tenha medo. Segure o relógio com uma mão, com dois dedos na roda da corda, suavemente faça-a rodar. Um outro tempo começa, perdem as árvores as folhas, os barcos voam, como um leque enche-se o tempo de si mesmo, dele brotam o ar, a brisa da terra, a sombra de uma mulher, o perfume do pão.
Quer mais alguma coisa? Aperte-o ao pulso, deixe-o correr em liberdade, imite-o sôfrego. O medo enferruja as rodas, tudo o que se poderia alcançar e foi esquecido vai corroer as velas do relógio, gangrenando o frio sangue dos seus pequenos rubis. E lá bem no fundo está a morte, se não corrermos e chegarmos antes para compreender que já não interessa nada."




quinta-feira, 24 de outubro de 2013

Nota de rodapé








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Minh'almanseiabarcar mais do que meu braço abraça.

quarta-feira, 23 de outubro de 2013

Apropriação indevida

Um dia sem te ver me deixa de olhar vazio. Um dia sem teu beijo não tem cor. Um dia sem falar contigo desreinventa meu idioma. Um dia sem andar do teu lado tropeça minhas pernas. Minha voz não canta, meu corpo não dança, eu sou menos eu. Nem fome eu sinto. Nem sede eu sinto. Só de você. De você.

Vê? Tua presença diária na minha rotina demandaria prescrição médica: é motivada por razões fisiológicas seríssimas. Pessoais e intransferíveis - necessidades que só você pode suprir. Não que eu porte qualquer tipo de doença, mas tua ausência me faz menos feliz.

Não posso ir. E lhe escrevo desejando que entenda: preciso ficar onde você estiver. Preciso descobrir aonde queremos ir. Preciso de uma dose de você todo dia. Na verdade, eu quero é tomar um porre de você, pra ter uma ressaca do teu amor.

Os sintomas? No lugar da dor de cabeça, um bom humor indescritível. No lugar da consciência pesada, plenitude. No lugar do “nunca mais vou fazer isso”, o “não vejo a hora de chegar amanhã”. E amanhã, começar tudo de novo.

sábado, 19 de outubro de 2013

Dia de festa no céu: cachaça e violão!


Porque nem só de RBD se faz uma Luísa Zanni

   Meu amor pelo poetinha tem anos de história. Desde sempre morri de amores por Vinicius - e, ah! Que delícia morrer de amores ouvindo afro samba e bossa nova! Nos trabalhos sobre ultrarromantismo, na época da escola, lembro de ser fortemente inspirada por esse tal de Vinícius de Moraes - um cara que, quando amava, não brincava em serviço. Como disse alguém no documentário Vinicius, o cara era apaixonado por ser apaixonar. E as mulheres se envolviam com ele mesmo sabendo de sua fama de, digamos, galinha. Vinicius era um apaixonado pelos prazeres da vida, e deixava isso bem claro em sua vida e em suas poesias.
   Diplomata, poeta, mulherengo, boêmio, músico, o cara escreveu também prosa e teatro. E bebeu, bebeu, bebeu. E amou, amou, amou. E me fez/faz feliz, feliz, feliz. Tem como carro chefe seus sonetos. Dentre eles destacam-se Soneto do Amor Total, Soneto do Maior Amor e o clássico Soneto de Fidelidade. Não posso deixar de indicar, também, o poema d'O Operáro em Construção: nem só de romance falava o poeta. O que dizer da Arca de Noé, então? Quem não conheceu aquelas músicas tem um buraco na infância!
   Lembro-me de uma vez, num show, ouvir Toquinho zombar: 'como é que um cara que escreve "eu sei que vou te amar por toda a minha vida" se casa nove vezes?'. Mas tudo não passava de brincadeira: Toquinho tem em Vinicius um ídolo e escreveu, junto à Chico Buarque Lindo de  Olhos Mais Lindos Ainda Hollanda um delicioso Samba pra Vinicius. Outra pérola de Vinicius delatada por Toquinho naquele show foi sua alquimia: "eu quero gelo até a boca do copo e uísque até o gelo boiar".
    Lembro-me também de haver comentado com certo amigo extremamente feminista sobre a beleza que é aquele poema, Receita de Mulher. Olhe, por pouco não fui reduzida à pó pela reação de meu amigo. Devo confessar que já não admiro mais tanto esse poema em especial. Mas que fazer com todo o tempo de minha vida que passei admirando? Não me culpo, também. Até pra ser preconceituoso o cara arrasa na retórica! De todo modo, minha paixão por Vinicius não foi mais a mesma nesse 2013 de transformações.
    Até o ano passado, encontrava muita beleza no estar triste. Quer dizer, eu sei que ser alegre é melhor do que ser triste. Alegria é a melhor coisa que existe! É assim como a luz no coração. Mas pra fazer um samba com beleza é preciso um bocado de tristeza, se não, não se fazer um samba, não. Sofrer por amor, então, era de uma nobreza incomensurável. E olhe, como sofri! E quer saber? Adoreeeeei sofrer. Sofrer por amor era lindo, minha gente! Todo grande amor só é bem grande se for triste, dizia aquela música que foi um hino para mim por tanto tempo. Continuo achando de uma sutileza requintada esse papo de achar bonito ficar triste. Só cansei dessa vida... Resolvi achar muito mais bonito ser feliz e talvez por isso, Vinicius e todo seu supermegaultrarromantismo tenha ficado um pouco de lado na minha vida. Mas, ai, se é uma página virada, que orgulho de tê-la no livro da minha vida!
   Certa vez um músico, pai de uma amiga, me contou a seguinte história: estava recém escrito o musical Pobre menina rica e um de seus amigos e parceiros lhe veio indagar:
- Vinicius, que o moço pobre tenha se apaixonado pela rica menina que observava, eu compreendo, mas... A menina rica se apaixonar por alguém tão pobre não é um tanto improvável?
E o poeta, viniscescamente respondeu:
- Meu caro, era primavera!
   E quem há de questionar-lhe depois disso?
Se Vinícius é machista, caros leitores invisíveis, eis um machista a quem eu amo profundamente (Thomas, não me odeie). O cara é bem maior que qualquer possível defeito na personalidade e até no caráter dele. A obra dele é ainda maior que ele. E por isso, tenho um respeito sem fim por esse homem.

Saravá!
Lu

quarta-feira, 16 de outubro de 2013

"O ser não é mais que o vir a ser"

O sentimento é medo
E a companhia é amiga.
O desafio é grande
E a recompensa é maior.

O suor é frio
A tremedeira é perna
O medo é medo
De não ser melhor que eu

O lugar tem nome
de passarinho
Os passarinhos
são a voz do lugar.

O sentimento instiga.
O sentimento transmuta.
O sentimento transcende.
O sentimento é coragem.

O medo é passageiro,
A dor é ilusória,
O mantra é dhanyavad
O sentimento é paz.

-

Dhanyavad ananda é um mantra que nos traz a Gratidão. Gratidão é um sentimento que nos traz paz. Ser grato pelo que se tem nos faz esquecer um pouquinho a frustração pela ausência daquilo que gostaríamos a de ter. Esquecer a tristeza é ter felicidade, certo? Certo! A meditação nos possibilita um momento de encontro conosco. É como sonhar acordado. Quem é que tem tempo de prestar atenção na própria respiração, avaliar o próprio caráter? Quem é que tem tempo de sonhar acordado? Quem é que tem tempo de acordar do sonho acordado novinho em folha pra realizar? Quem medita, garanto. E sou grata.

Nem mesmo a falta de lugar apropriado serve de pretexto. Meditar morando numa grande cidade exige concentração, mas o que é que não exige? Mas ainda em meio a tanto barulho de cidade grande, a natureza silenciosa regia sua orquestra de ventos e ondas logo ali, saltando do metrô, virando a esquina do Medo. É só olhar mais fundo para se reencontrar.


SABER :: OUVIR :: CALAR :: OUSAR

Gratidão,
Lu

terça-feira, 8 de outubro de 2013

Telefone sem fio

As paredes tem ouvidos:
multiplicam o que ouvem por aí.
Os ouvidos tem paredes:
só se ouve aquilo que se quer ouvir.

terça-feira, 1 de outubro de 2013

No verso de uma apostila sobre fonética e fonologia

Os grandes normais existem desde que se lembre. Eles são quase como deuses: entendem o mundo e sabem viver nele. Todos nasceram pequenos e sem saber o que era ser normal. Crescerem e aprenderam junto ao tempo.

As crianças erram, aos olhos dos grandes normais, o mundo em suas coisas mais óbvias. Distorcem o idioma, gritam intimidades, choram quando contrariadas, correm da mão da mãe, ignoram o perigo. Encantam-se com flores, com cachorrinhos, com o próprio cocô. Mas ninguém as recrimina por errarem: sabe-se que seu pecado é conhecer o mundo há pouco tempo e, por tanto, ainda não terem aprendido a entendê-lo e a viver nele com maestria.

O tempo passa, o que é pequeno cresce, e o grande pode ser normal ou louco. O grande louco erra o mundo, como a criança, apesar de já ter vivido muito. Por algum motivo que mora dentro da própria cabeça, o grande louco peca por não agir como a esmagadora maioria de grandes normais, mas é perdoado quando recebe dos médicos um negócio chamado Diagnóstico. É um passe livre pra ser grande sem ser normal.

Há, entretanto, um grupo de grandes crescidos que não são normais nem loucos. Gente grande que se relaciona poeticamente com a vida, como se jamais houvesse crescido. Gente que procurou médico e não ganhou Diagnóstico, mas que reinventa a realidade como se fosse louco. Costuma-se chamar essa gente pelo nome de artista.

O artista é um maluco com licença poética. Um adulto que finge que não cresceu. É a pessoa que conhece o mundo todo dia pela primeira vez, e faz isso consciente do que faz. É uma pessoa que não desistiu de si, que não gostou de ser normal, que enjoou de ser pequeno, que não ganhou passe livre pra ser louco perante o mundo. É gente que mandou os números e nomes às favas, e, dizem, é bem mais feliz assim.

Lu