Não me dou bem com números. Estatísticas, fórmulas, casas decimais e gráficos não são para mim. Minha má relação com o raciocínio lógico não é de hoje, nem se resume, simplesmente, à matemática. Estou longe de ser a pessoa mais indicada para explicar reações químicas, enzimáticas, escalafobéticas, ou algo semelhante. Não sirvo para memorizar processos de desenvolvimento de seres microscópicos no corpo humano. Tampouco sou capaz de compreender as rixas no Oriente Médio, ou no meu próprio país, sendo bem sincera. Nem de criar uma linha do tempo mental que me contextualize historicamente e torne meu estudo mais direcionado, claro e lógico.
Não tenho lógica. Desconfio do que é lógico. Não faço sentido. E espero que não esperem que eu faça. Não sigo raciocínios lineares, nem estabeleço nenhum nexo com o mundo em que vivo. Entre razão e emoção, sou inundada pela segunda. Sou hiperbólica, metafórica, exclamativa e interrogativa. Nitidamente paradoxal. Sempre reticente, nunca pontual. Me inexplico em verso e prosa, porque as palavras assumem a forma que quiserem a partir de mim. Não faço parte do que se enquadra. Parafraseio e intertextualizo, mas não sou cópia. Sou texto alheio de autoria própria. Sou rima sem intenção. Eu sou aquilo que vem pra gerar dúvida, e não para responder. Mas não sou filosofia. Não posso ser seguida, nem refletida, porque estou decidida a ser indecisa para sempre.
Sou rascunho de palavra. E como autora que crio do rascunho que sou, anseio deixar logo o status de rascunho e alcançar o estágio “obra”. Quero ser uma palavra. Mas não qualquer palavra, porque toda palavra é limitada a partir do momento em que ganha sentido. Não quero, por exemplo, ser a palavra “ilimitado”, porque o limite do ilimitado é não ter limites. E eu quero o direito de escolher ter ou não limites.
Quando eu for palavra, hei de ser aquela palavra que me permita formar todas as palavras que quiser no futuro, ou em qualquer tempo verbal. Serei palavra, enfim, se for a palavra que, semelhante a “infinito”, não cabe nem na imaginação humana. Pena que infinito já tem sentido agregado, e está fadado a ser só infinito desde sempre e para sempre. Eu quero ser o que está por estar por vir. Serei a única palavra que é matéria prima para todas as outras que esperam ser forma(n)das. Ainda sou pauta em branco. Mas em breve, serei Letras.