quinta-feira, 27 de fevereiro de 2014

agridoce lar

papai não fere.
mas fere.

não na mão estalada na cara.
não em palavras de baixo calão.
não na fivela de um cinto.
não em ameaças ao corpo.

mas fere...
pré-fere.
nos olhares não dirigidos
nas chantagens emocionais
na humilhaçãozinha nossa de cada dia
nos favores severamente cobrados depois

prefere
os silêncios tão duros aos abraços molinhos
o não olhar gelado que atravessa almas
[à piscadela sapeca no descanso de uma rotina

nada é. tudo está.
mas papai é feroz por estar ferindo há muito tempo.

mamãe não gosta de meninas.
aliás: mamãe não gosta
que eu goste
de meninas.

mas mamãe sente o mesmo que eu:
saudades de um tempo
em que um sentimento
ainda se fazia presente.

no mais, nada importa.
nada é. tudo está.
e pode, num instante,
deixar de "ser".

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