quarta-feira, 10 de setembro de 2014

Antigamente uma crendice popular contava que uma mulher que sentasse num banco quente engravidaria do último homem que tivesse sentado ali.

Hoje sentei num banco de ônibus aquecido pelo sol dessa cidade. Eu devo estar - pensei comigo - gestando fogo dentro de mim.

quinta-feira, 28 de agosto de 2014

voluntariado

Estava de férias em Natal quando decidi, num rompante, me desligar de uma bolsa que me pagava pra estar em sala de aula - coisa que amo - pra ter mais tempo pra dar aulas voluntariamente à crianças carentes. Sempre quis fazer algum tipo de trabalho voluntário.

Desde que dei o primeiro passo pra fora de casa, tenho dado atençõezinhas aqui e acolá a uma certa vovó muito fofa - mas não mais fofa do que a minha - e me dei conta de que voluntariado é doação, onde quer que se esteja. Altruísmo é tirar o amor da prateleira da teoria é encaixá-lo na corredia cotidiana..


domingo, 10 de agosto de 2014

1.9.0

Eu me sinto mais bonita
quando durmo com você
Hoje eu sinto que a própria vida
Resolveu amanhecer

Trazendo consigo uma graça
[própria, uma beleza
Uma casa com forninho e rede
em plena Santa Teresa

Eu nos vejo de mãos dadas
pelas ruas de Berlim
Eu te vejo num domingo ensolarado
tocando violão pra mim

Eu nos vejo dentro dessa correria
sem saber o que fazer
Eu me vejo num domingo à noite
cantando só pra você

Eu prevejo brechas
Eu escrevo peças
Eu faço canções

Você me desperta
de asas abertas
a plenos pulmões

E o dia vem, com caixas, flores e papeis
E vem a noite em luas cheias ou não
Vem as tardes de preguiça no sofá
Pina, Oswald, Oswaldo e Beauvoir

A vitória do cravo vem
E vem morangos e os plantões
venham também. E no mais,
Apontadores-gramofones-cais







quinta-feira, 7 de agosto de 2014

4x7

Também quero
Morar sozinha
E ter na cozinha
Um forninho amarelo

sábado, 2 de agosto de 2014

Di

Feliz como quando ia "conhecer" a Anahí. Como quando ganhei minha sapatilha de ponta. Como cada vez que me apaixonei por alguém e fui correspondida. Como na primeira e na última vez que subi num palco. Como quando viajei na consciência onírica. Como quando concluí o colégio. Como quando passei pro curso que sonhava na faculdade que queria! Como quando beijei meu amorzinho a última vez, sem precisar pensar em adeus, e poder pensar no próximo beijo, abraço, cafuné.

Hoje, querido diário, eu vou voltar a fazer teatro.

sexta-feira, 25 de julho de 2014

fazdeconta

Amor é coisa feita à mão
costurada com linha de pipa
numa madrugada-cenário de ansiedade existencial.

Caderno é coisa feita pra guardar poesia
que é o que há de acalentar o dia
que o céu ainda nem bem costurou

Caderno feito à mão é coisa feita de-com-por amor

quinta-feira, 17 de julho de 2014

Desesperadamente eu grito em português

Depois de meses resistindo, finalmente fui fazer as unhas num salão. Acho que foi a segunda vez que fiz isso na vida. Não que eu seja desprendida de vaidades (aliás, não mesmo), mas existem ambientes que definitivamente não combinam comigo, e salão é um deles. Mas fui lá. Era do lado da minha casa, estava com tempo livre, a unha estava uó, etc. Cheguei na hora marcada e a recepcionista disse "vou chamar a profissional, ta bem?". E ANUNCIOU num microfone:
- Profissional Silvana, cliente espera - com aquela voz de telemarketing, sabe?

Fiquei embasbacada com tanta pompa. Só queria dar um trato na unha, po. Me incomoda sinceramente esse papo de "profissional". É difícil pra mim entender a resistência das pessoas em chamar uma manicure de manicure. É a mesma resistência que as faz chamar empregadas/diaristas de "secretária", a mesma resistência que as faz chamar negros/negras de "afrodescendente" ou (essas são de doer) "moreninho", "escurinho". "De cor" (ai).

Caros nativos de língua portuguesa, entendam: se vocês acham que pega mal se referir à alguém como manicure quando ela trabalha pintando unhas, como empregada/diarista se ela vive desse trabalho, como negro ou negra se é a essa etnia que à qual essa pessoa pertence, saibam que vocês estão sendo duplamente preconceituosos. Isso não é ser politicamente correto - é ser hipócrita. Está implícito no discurso de quem chama sua empregada (que é o que ela é já que você a empregou, certo?) de secretária o pavor de que alguém descubra esse tom depreciativo que a palavra empregada adquiriu na mente de quem a evita. A empregada não é menos que você por trabalhar na sua casa. O negro não é menos que o branco (amarelo, vermelho, azul...) que o chama de negro. A manicure não é menos que eu por pintar as minhas unhas - eu vou pagar pelo trabalho no qual ela é especializada e eu sou um terror. Eu sou professora, ela é manicure. Simples assim.

Outra coisa que me incomodou recentemente no uso equivocado que as pessoas fazem da própria língua foi a total descontextualização de um discurso. Olhe, vou pedir um favor: não descontextualize Paulo Freire. Isso é coisa de gente que compartilha Caio F Abreu no facebook dando os créditos à Clarice ou ao Pessoa (nada contra o Caio, pelo contrário, mas respeitemos os cânones e principalmente as autorias, por favor). Retomando: leia Paulo Freire antes de compartilhar uma imagem criticando o PT  (e quero deixar claro que não sou partidária) pra mostrar pros seus amigos da faculdade que você é politizado. Leia porque aí: 1) você vai recobrar sua esperança na humanidade. Freire é o que há. E 2) você vai entender que a intenção dele com aquela frase linda ("Quando a educação não é libertadora, o sonho do oprimido é ser opressor") não foi criticar a Dilma nem nenhum político que estivesse sendo alvo de críticas massificadas na época do Pedagogia do Oprimido, senão criticar essa cultura de abuso de poder que temos por aqui.

Pra me redimir, termino com Caio (creditando à Caio, porque é de Caio): que a revolução venha, "e que seja doce".

segunda-feira, 14 de julho de 2014

assim

Tenho vocação
para bocastronomia.
Quero desvendar
as estrelas do teu céu.

quarta-feira, 18 de junho de 2014

Eu ainda lembro

Era aula de geografia. Ensino fundamental II. Daquele professor que dizia que eu era comunista pela bandeira vermelha que eram meus cabelos. Ulisses - tinha que ser esse o nome daquele cara sensacional - conversava com a turma sobre o conceito de "qualidade de vida". Levantei o dedo. Questionei o fato de a medição de qualidade de vida se relacionar com poder aquisitivo e status de um indivíduo. O professor - comunista, por supuesto - olhou pra baixo entre desolado e "você tá certa". Anos depois o encontrei na Cinelândia, numa daquelas manifestações que não eram só por 20 centavos. Ele não me viu, mas vê-lo causou o mesmo turbilhão de sempre dentro de mim.

Continua não sendo só 20 centavos. Qualidade de vida não é poder. Felicidade mora dentro de mim e a correria da cidade não permite que eu mesma me ouça, me toque, me sinta, me cresça.

Vou me desligar do PIBID. Vou distribuir pedaços do céu por aí.  Vou me jogar trabalho voluntário. Não faz sentido ser professora e não dar aula da maneira que eu acredito que valha a pena.

Não faz sentido ter dinheiro pras aulas de dança se não tenho tempo de dançar sequer sábado a noite.

Não dá pra ser atriz nas entranhas e ficar sem fazer teatro. Não dá pra estudar Letras e não ter tempo de ler minhas poesias favoritas quando eu quiser ou precisar.

O tempo está a nosso serviço, e corre lentamente a nosso favor. Quero o tempo dos beijos. Dos olhares. Dos abraços e sorrisos. Quero o tempo do vento, das praias, do mantra agradecido ao universo. Quero o tempo das conciliações.

dhanyavad ♡ gratitud ♡ gratidão

quinta-feira, 5 de junho de 2014

Flor

Me sinto bem
feliz porque o modernismo atenta pras gotas de chuva
e o celular descarregado me faz atentar pros raios de lua
feliz por pingar em meu prosaico cotidiano doses da cal mais poética de que já se ouviu falar

M

nada é tão imã
quanto um professor
de literatura apaixonado
pelo que ensina

segunda-feira, 2 de junho de 2014

Sinto muito

Mas quer saber? Não sinto culpa. Sim, você é incrível e meu ego adora que você veja qualquer coisa de poesia em mim. Qualquer coisa que valha a pena. Sim, você é incrível, mas isso não te dá o direito de dizer ao que eu vim e ao que eu não vim pro mundo. Mesmo que eu concorde contigo - e não estou dizendo que concordo. Ainda não me decidi sobre o que penso de mim mesma.

Você tem o direito de ter se sentido ofendido. Até porque, numa coisa está mesmo certo: deixei meu recado claro (ainda que sem querer): não quero compromisso. Com nada. Com ninguém. Com arte nem ciência. Com realidade de nenhum tipo. Comigo. Ninguém.

Sinto muito: tristeza, alegria, raiva, ansiedade, medo, amor. Mas não deixo senão rastros de sonhos em meu travesseiro ao despertar. Culpa alguma mora em mim.

Sinta você.

segunda-feira, 26 de maio de 2014

Bons ventos trarão a verdade

Curioso como a trilha que eu compus para um ex amor se adeque tão bem a outro ex amor.

Fosse noutros tempos, eu faria questão de ir te perguntar que foi que eu fiz pra simplesmente não ser tratada por você. Você que sabe perfeitamente o quanto eu detesto mais que tudo ser ignorada - porque destratar alguém é agir sob raiva mas ignorar alguém é brincar de considera-lo nada. E ninguém merece ser alvo de uma suposta invisibilidade. Você que sabe que eu não ignoraria nen meu maior inimigo (caso eu me desse ao luxo de ter inimigos).

Mas hoje sua ignorância não fere sequer meu ego. Talvez eu esteja mais madura desde o fim daquela história tristemente linda que eu tive a oportunidade de protagonizar tres años tras. Talvez eu tenha até me tornado menos sensível.

Mas eu tendo a crer que minha quase indiferença tenha a ver com o fato de, dessa vez,  eu trazer minha consciência absolutamente limpa.

Olho na tua cara e já nem te reconheço, o que também tem lá seu lado bom: aquela criatura a quem eu mil vezes declarei meu amorzinho ainda é de caráter intacto na minha memória.

Como a memória é cuidada pelo reino do Passado, importa menos o que é real do que aquilo que se lembra.

quarta-feira, 21 de maio de 2014

la vida es circo

te veo
me ves
no nos miramos

otra gente
te aprieta las mejillas
a otra risa suenan
tus chidas cosquillas

otras amigas
de otra novia
? otra madrina?

cambio de opinión
(incluso política)
(si ustds supieran
cuántas q están equivocadas...)

no te extraño
pero te pienso
- !no lo niego! -

es que eso es raro...
el tiempo pasa, las cosas cambian
y lo que ya fue un solo corazón
hoy son trocitos de planetas diferntes
ineditamente combinados bajo la luz de un nuevo día.
un nuevo rompecabezas, una nueva cuerda floja.

domingo, 18 de maio de 2014

A vida é um observatório da própria vida

Há alguns dias, lembro-me bem, descia as rampas da faculdade acompanhada de dois amigos. Ríamos à toa, falávamos amenidades - a prova de fonética, aquela professora louca, etc. Eu estava frágil naquele dia. Frágil a ponto de não entender que, ao final das rampas, era natural que cada um seguisse seu caminho. O rapaz foi para o metrô. A moça foi para um ponto de ônibus do outro lado da rua. E eu me vi só.

Eu me senti só.

Senti o peso da solidão caindo nos meus ombros como se meus ombros sustentassem ali todo o firmamento. (A solidão é de um azul escuro como o azul escuro do céu quando é noite. Mas sem o pontilhado de estrelas. E azul escuro sem estrelas PESA.)

Voltei pra casa fragilizada e desesperadamente solitária. 

Dias passaram. Na tarde de hoje, estive em uma bela biblioteca com uma amiga. Mergulhamos cada uma em diferentes corredores que se dispunham lado a lado - ela, no que se via escrito "cinema" e eu, no que se via escrito "teatro". Nossa entrada simultânea nos diferentes corredores parecia ter sido coreografada. A risada foi inevitável. Me senti acompanhada.

Não porque houvesse alguém ao meu lado, mas porque havia a possibilidade de recorrer a alguém caso fosse necessário. Pode ser bobeira, mas aquele instante foi precioso. Entendi o seguinte: é natural cada um seguir o seu caminho. Cada um mergulha no corredor em que se vê escrita a palavra que lhe apraz. Mas os corredores estão todos dentro de uma mesma biblioteca, então, sempre acabaremos esbarrando com aquela amiga que tanto se precisava encontrar. 



sábado, 3 de maio de 2014

Geração-manifesto-frivolidade

Não, não, não, não, eu não consigo. Não acho que sexo obrigatoriamente tenha a ver com amor nem sou ninguém pra julgar quem lida com sexo de maneira leviana - cada um sabe de si. Mas eu não consigo achar que é só uma questão de pele. Sem olhar, sem arrepio, sem um encaixe absoluto e um certo afeto não dá, não dá, eu não consigo. Não me entenda mal: adoraria conseguir. Imagino que seja uma questão de entrega. Talvez eu só não esteja bêbada o suficiente, mas você está. E minha saia - é bem provável - é suficientemente curta pra você achar que eu tenho uma relação bem mais simples com o meu corpo sob o corpo de outras gentes. Mas ao contrário do que disse Elis naquela música que tocou agora há pouco, meu caro, as aparências enganam sim.

Sinceramente, nem o beijo assim, invasivo, faz sentido. Sem conversa, sem um flerte, sem - talvez, sei lá - suas mãos passeando lentamente pelo meu pescoço. Gosto dos seus olhos, da sua barba, da sua maldita blusa xadrez que me fez te perder no meio de mil caras de blusa xadrez. Gosto do seu beijo, até. Não me entenda mal. Mas não o suficiente para querer te beijar de novo, por exemplo - apesar dos seus olhos. As pessoas quase nunca lembram disso, mas um beijo é algo peculiarmente íntimo, e eu gosto muito dessa palavra - "íntimo" - porque ela diz exatamente o que eu quero dizer. É como se a palavra entrasse em mim quando eu a profiro: íntimo. Depois, ela escorre pelos cantos da boca, como escorre doce pelos cantos da boca de quem se delicia.

Quando eu pergunto quem é você, tudo bem se resumir em "João". Mas isso é muito vago, entende? Minha pele não quer saber teu nome. Meu corpo não ta interessado na faculdade que você faz. Eu queria mesmo era saber sua cor favorita, saber se você chora quando vê um filme triste, se acredita em deus e qual música você mais canta enquanto toma banho. Bacana você morar perto de uma saída do metrô em Copacabana, mas, sinceramente, acho melhor você procurar outra menina de saia curta pra te acompanhar na volta pra casa. Boa noite.


quinta-feira, 24 de abril de 2014

Deixar no ar

Apolo,

Te disse que ia escrever quando chegasse em casa e é só por isso – e não por falta de preguiça ou cansaço – que eu to fazendo isso agora.
Foi assim. Comecei a escrever e não parei enquanto o sono me deixasse continuar.
Assim, sem pensar. Sem revisar. Sem voltar atrás pra me corrigir – como eu deveria agir o tempo todo.
Eu não sei por que eu não consegui olhar pra você quando disse que você é especial ou importante, ou seja lá o que eu tenha dito, mas acho que é pelo mesmo motivo que te fez dizer “minha mãe diz isso todo dia!” naquele tom de brincadeira de quem não sabe ou tem vergonha de lidar com seriedade. Ou não quer deixar o clima sério demais, embora tivéssemos ali a leveza da pena de uma pomba branca voando sem destino com a brisa na beira da praia de Copa num dia de sol ameno. Mas a verdade é que você é, de fato, muito especial. Muito. Não é coisa pouca, não. Você é daqueles que fazem a vida valer a pena.
Porque você me faz perceber coisas em mim que eu sei que me fazem valer a pena. Porque você de vez em nunca se abre comigo e me fala da sua vida, e cada segundo de confiança que você deposita em mim e é extremamente valioso e eu queria que você soubesse disso.
Eu nem acho, por assim dizer, “necessário” estar escrevendo isso tudo pra garantir que você saiba o tamanho da sua importância na minha vida. De certa forma, estar aqui escrevendo pra você até vai contra algumas coisas que eu tenho pensado ultimamente. Porque algumas coisas – as mais importantes, desconfio – não precisam ser ensinadas, racionalizadas, explicadas, entendidas. E eu sei e você sabe (e eu sei que você sabe que eu sei) disso. As coisas mais importantes na vida só precisam ser sentidas.
Mas eu to te devendo três palavras há uns três anos e sei que você merece isso, por menor que seja minha atitude, embora eu esteja escrevendo e não falando... Mas imagine minha voz dizer assim, bem forte: eu te amo.

E ainda vou conseguir dizer isso te olhando fundo nos olhos, talvez com algumas lágrimas escorrendo pela minha pele, e certamente com o coração recarregado de esperanças, pronto pra me fazer seguir em frente, em busca de um rumo qualquer que me faça genuinamente feliz.

Com todo o sentimento do mundo,
Zanni

segunda-feira, 21 de abril de 2014

Tô de licença!

 Eu já não sou mais a tua pequena, que pena... ♫ Que pena, amor. Que pena que outra pessoa te chame assim. Que pena que você chame outra pessoa assim. Não que seja pena você estar feliz. É pena que minha felicidade não siga o compasso da tua. Ando sincopada. 3 por 3. 1. E você? Calmaria acompanhada de calmaria, imagino. Paixão faz isso. Mãos dadas. Amor. Seu amor, minha saudade. 
  Que pena que eu não pude ser o amor que você julga merecer. Que pena que você não foi o amor só meu pra sempre. Que pena, que pena... Eu só sei me sentir pequena? Diacho! Será que vai vir outro amor? Deve vir. O amor sempre vem, dizem. É só estarmos alinhados com o universo, creio. Mas será que vai ser tão amor do jeito que o nosso era? Prevejo comparações. É a minha cara comparar flores e declarações. Acho que é a sua cara, também. E nessas comparações, é claro, quem ganha é quem ta do teu lado agora. Tanto ganha que continua do teu lado. Já reparou nessa competição surda que existe entre o amor presente e o amor passado? Fico desejando que, mesmo que só de vez em quando, você sinta falta de mim.
  Será que o seu amor de agora é tão Amor quanto o nosso foi? Sinto sua falta. Já passaram tantas águas que nem sei mais distinguir se sinto falta do seu amor ou de um amor qualquer. Já mudei tanto e voltei a ser quem era tantas vezes que não sei bem ao certo no que acredito quando o assunto é esse tal de amor. O amor... Essa complicação toda sem a qual eu não pareço conseguir ser feliz. Me identifico comigo como se eu não fosse eu. Me identifico com o meu próprio sentimento como se me deparasse com uma poesia de um desses grandes poetas. Vinícius, por exemplo. Sinto como sinto quando leio um poema de Vinícius e me identifico profundamente com o que ele diz. Sinto como se encontrasse o meu sentimento fora de mim. Uma espécie de compreensão recíproca, vinda de um mesmo lugar: meu peito.   Tanta coisa boa na minha vida, e eu inerte. Essa peça, e a delícia que é estar no palco e no camarim. A delícia que são os caquinhos de texto, os aplausos, os agudos que brilham, os elogios, a maquiagem e o figurino. O estágio, e a maravilha que é gostar tanto de querer ser professora. O laço que nunca se dissipa, os amigos tão bons, e o fim de tarde olhando Marani. Toda a grandeza da qual tenho percebido ser capaz... É tudo maravilhoso! E eu inerte. Maldita internet.    Não é que eu seja triste todo dia. Tenho fases como a lua, já diria Cecília. E hoje estou cansada, como Clarice. Cansada de fingir que te esqueci. Não é possível lidar bem com a tua ausência todo dia, afinal.  Às vezes escrevo por isso. Escrevi n'alma um poema cujo eu-lírico, após muito penar, superou seu ex amor. Mas hoje, o tal eu-lírico cansou. Hoje, a força está de licença. Como na época em que se brincava de pique-pega. Você deve ter brincado disso também. A gente pedia "licença", e ninguém podia pegar a gente. Licença poética deixa o eu-lírico imunizado da doença que é a obrigação de ser forte todo dia. Hoje, vou ser fraca. Hoje, vou assumir pro espelho que te amo e que sinto tua ausência em cada centímetro da minha pele. Hoje, vou admitir pro meu orgulho que tenho preguiça de seguir em frente. Tenho sido tão forte pra quem sofre de lonjuras, como Caio! Hoje vou me permitir sentir tua ausência e por ela sentir tristeza e não sentir culpa por isso. Hoje eu vou sentir. Ah, vou. Hoje eu vou sentir muito.

quarta-feira, 16 de abril de 2014

estive pensando...

diz-se por aí que os olhos são as janelas da alma. creio que o avesso também vale: as janelas são os olhos da casa. nos observam viver. observam a vida correr nas ruas - ai, o lado de fora de nós! - e, a fim de não morrer de solidão melancólica, contam tudo o que veem às paredes que, como bem sabemos, tem ouvidos.

deve ser por isso que eu gosto tanto de janelas: elas me mostram o mundo e me mostram a mim bem mais do que qualquer espelho. e bem mais do que alcança a minha vã miopia.

domingo, 30 de março de 2014

Veterano de guerra

Clube de Leitura e Escrita Criativas
uma postagem sobre o tema "Insólito"

Fala-se em demasia sobre o cheiro dos livros novos. Ah, o cheiro do novo! Ah, o cheiro do prazer de adicionar algo novo a uma estante de velharias! Renova-se – diz-se – toda a vida!

Pois sim!

Duvido da graça do cheiro dos livros novos. Aqueles livros com cheiro de plástico, cheiro de quilometragem zerada, cheiro de páginas sem orelhas, sem rabiscos, impressões, anotações e lagriminhas derramadas à meia luz de uma noite insone. Um papel que seria inteiramente branco não fosse a presença daquelas letrinhas feitas de tinta prensada contra o papel.

Mais vale o cheiro dos livros velhos! Aqueles livros de edições tão antigas que os avós de nossos avós devem ter visto nas vitrines. Aqueles de páginas já amareladas, nas quais estão impregnadas histórias das mais variadas... Muito mais histórias do que um único livro seria capaz de abarcar sendo só um livro intocado (porque o que faz de um livro um livro é a leitura – não o formato).

Aqueles livros que foram entregues ao sebo como crianças entregues a um orfanato. Livros abandonados, solitários na fila de espera por um leitor novo com cheiro de alguns quilômetros de história já rodados, mas com disposição o suficiente para rodar muitos outros, no plano do fictício e do real.

Aqueles livros que custam cinco reais nas deliciosas feiras itinerantes. Livros temporariamente órfãos porque uma mãe solteira precisava de grana pra botar comida na mesa e vendeu sua coleção – imagine só: há gerações na família! - de clássicos nacionais. Capa dura, vermelha. Título escrito em dourado. Livros desprovidos de dono porque um jovem interiorano quis tentar a vida no Rio de Janeiro e largou seu On The Road nas proximidades da rodoviária pra ser de alguém que precisasse lê-lo. Porque uma moça perdeu seu amor pra morte e nunca mais suportou ler Cyrano de Bergerac.

Ninguém se despede de um livro sem dor, ainda que não se dê conta da dor que abriga.

Ninguém adquire um livro que não seja novo, mesmo que o adquira já velho de guerra.

Ninguém adquire um livro sem se renovar um pouco (ou sem renovar um pouco o próprio livro), mesmo que o livro já exista há mil milênios.

Ninguém deixa de envelhecer - pasme! - ao comprar um livro novo em folha.

Mas um livro que já teve outro(s) dono(s), por trazer em si o triplo de histórias, dá a cada palavra mais mil possibilidades de significado do que o usual.


Livro usado tem cheiro de história vivida - o que, de maneira alguma, impede as histórias ainda por viver.

sexta-feira, 14 de março de 2014

Cadê você?

Ah, a felicidade mora dentro de mim! Posso senti-la em cada poro do meu corpo e em cada imaterial da minha alma como sinto esse sol se escaldando na minha pele. Mas ainda sinto falta de você, amor. Não, não vocês, amores passados. Vocês foram incríveis, mas não sobra nenhuma falta de vocês aqui onde o vento é brisa. Sinto falta de um amorzinho pra dar beijinho, acordar agarradinho e botar tudo no diminutivo como se não houvesse amanhã. Um xodó, como diz a canção, pra alegrar ainda mais o meu viver. E digo "ainda mais" pois escrevo sem pesar nenhum. A alegria está aqui. Mas quero um ombro pra encostar meus cabelos e minhas doideiras, e quero uma cabeça pra fazer cafuné e ajudar a ser feliz. Uma boca pra lembrar que delícia é beijar na boca de quem se ama. Um corpo pra desbravar, conhecer cada pedacinho, saber como atiçar,satisfazer e tranquilizar. Uma criaturinha pra confiar e entregar minha gratidão. Pra dançar Reconvexo bem arroxado como se nossos corpos pudessem ser um só. Cantar aos fins de tarde e sonhar com o futuro sem esquecer de viver aquiagora.

Onde eu te encontro, meu amor? Nas festas onde ninguém se ouve? Nos corredores do meu lugar de estudo, mais uma vez? Será? Bem do meu lado, talvez, e eu nem percebi? Em algum lugar que eu ainda nem sei que existe? Ou ainda muito, muito longe e tão diferente de mim que eu jamais imaginaria? No prefácio de algum livro que eu nem sonho em escrever? Talvez no céu azul. Sem nuvens.

Me parece um bom lugar.


quinta-feira, 13 de março de 2014

pequenas poéticas da vida cotidiana


  • A moça de vestido branco virando a esquina em passeio com seu labrador.
  • Uma senhora gorducha e solitária tomando frappé na browneria.
  • A mãe solteira dando ao filho de mamar.
  • As brincadeiras em família.
  • Os cabos conversando com a copa das árvores.
  • O professor que fala com as mãos contando piada.
  • Minha parede destroçada.
  • O senhor que me deixou passar no trânsito.
  • A amiga que apareceu de surpresa.
  • As músicas que nunca deixam de fazer sentido.

terça-feira, 11 de março de 2014

Sobre "Ela"

Finis,

Você já viu "Ela" (aquele filme de cartaz rosa)? Esse filme me fez lembrar de tanta coisa... Por exemplo, de dois outros filmes (Matrix e a A Mulher Invisível) e um mangá: Chobits (você curte mangá? Eu já curti um bocado, mas já passou a fase). E lembrei dessa nossa relação "virtual". É claro, é diferente do filme. Você é uma pessoa de verdade e nós não temos um envolvimento amoroso. De todo modo, fiquei pensando nisso, entre outras coisas... A amiga com quem assisti o filme achou bastante graça do fato de um homem se relacionar com um sistema operacional. E eu fiquei matutando: será que não é isso que nós estamos fazendo? Não nós "Luísa e Finis trocando emails", mas todas as pessoas. O Facebook, o Twitter, os sms são plataformas que virtualizam nossas relações. Querendo ou não, perdemos um pouquinho de humanidade, e isso tem seus prós e contras. Discorda? Acho até que independentemente de tecnologias e redes sociais, vivemos de idealizar o outro.

Escrevo de dentro do metrô. No meu campo de visão, posso contar 6 pessoas mexendo em seus celulares. 7, se me incluo. Não sei direito em qual ponto quero chegar, afinal, o filme me fez pensar em tantos! mas... Isso não será um tanto esquizofrênico? Ou será só uma reprodução do que o ser humano faria de qualquer forma, com ou sem tanta tecnologia à disposição? Já fiz grandes amigos pela internet. Seu caso é especial porque não sei teu rosto. Não sei tua voz. Por isso Ela me lembrou do Finis. Enfim... Quando Samantha disse ao Theodore que conversava com outros milhares de pessoas enquanto conversava com ele, ele ficou com ciúmes (essa cena me fez pensar sobre tudo o que sempre pensei sobre amor, suas liberdades e as amarras que criamos tentando prendê-lo sem saber que assim o matamos). Assim como eu fiquei com ciúmes quando não recebi uma despedida exclusiva sua antes do carnaval, e até ralhei com você por isso. Não serei eu também um pouco esquizofrênica, nesse sentido? Será que o Theodore é louco por se apaixonar por alguém que não existe? Mas não é isso que fazemos sempre que nos apaixonamos por alguém e, por consequência, por toda a idealização que fazemos daquele alguém? Será que existe alguma possibilidade de gostarmos de verdade de alguma coisa, atividade ou pessoa pelo que ela é, essencialmente, e não por aquilo que ela representa pra gente?

Sabe, no fundo, eu acho que quem manda em tudo é a cabeça da gente. A gente ESCOLHE ser feliz ou não, gostar ou não de algo ou alguém. Só não sabemos disso. Theodore, afinal, não está tão louco. Se sentia só e se agarrou em algo que, por algum motivo, fez ele não sentir mais solidão. Acho que é o que nós fazemos o tempo todo. O que você acha, Finis?

Um beijo grande, grande, grande (apesar de virtual),
Lu

quarta-feira, 5 de março de 2014

Quero me lembrar para sempre com carinho do dia de hoje

Acordei cedo na quarta feira de cinzas disposta a finalmente aproveitar o carnaval deste ano. A princípio, tudo tendeu a dar errado. Mas teimei, que tenho lua e ascendente em touro e sou de teimar. Rapidamente consegui companhia pra folia, visto que o que não falta nessa cidade maravilhosa é gente com gana de ser feliz.

Desde segunda já tinha planejada a maquiagem que faria hoje, mas não fiz: saí na correria. Mas não saí sem antes deixar um recadinho - ah! as delícias da tecnologia! - à uma menina que acabou de perder sua irmã pra morte, e não pude deixar de fazê-lo, apesar do receio de ser invasiva.

Não fui invasiva: minhas palavras foram bem recebidas. Me senti bem. Saí de casa naquele passo deliciosamente apertado que tanto me apraz.

Ganhei risadas e um papo dos bons no caminho de ida pra festa.

Na festa, me dei álcool, dança e euforia de presente.

Meus olhos pediram, há dois anos, um beijo que ganhei hoje. Várias vezes.

Ganhei a companhia de amigos tão queridos!

Vi um filme que ganhou várias categorias no Oscar e concluí que 12 anos de escravidão era o melhor filme, mesmo. A Academia não ta com nada.

Ouvi que meu beijo tem a suavidade da escritura de um poema e fiz um desenho sobre isso.

Compus uma canção chamada Quarta feira de cores para uma amiga maravilhosa que cisma em não saber do seu valor e sinto que o resultado será positivo quando ela ouvir - assim que terminar de brigar com o namorado.

Quero me lembrar para sempre com carinho dos bons dias.

Por isso é que escrevo. Não posso parar.

quinta-feira, 27 de fevereiro de 2014

agridoce lar

papai não fere.
mas fere.

não na mão estalada na cara.
não em palavras de baixo calão.
não na fivela de um cinto.
não em ameaças ao corpo.

mas fere...
pré-fere.
nos olhares não dirigidos
nas chantagens emocionais
na humilhaçãozinha nossa de cada dia
nos favores severamente cobrados depois

prefere
os silêncios tão duros aos abraços molinhos
o não olhar gelado que atravessa almas
[à piscadela sapeca no descanso de uma rotina

nada é. tudo está.
mas papai é feroz por estar ferindo há muito tempo.

mamãe não gosta de meninas.
aliás: mamãe não gosta
que eu goste
de meninas.

mas mamãe sente o mesmo que eu:
saudades de um tempo
em que um sentimento
ainda se fazia presente.

no mais, nada importa.
nada é. tudo está.
e pode, num instante,
deixar de "ser".

terça-feira, 25 de fevereiro de 2014

joão bobo

fico olhando tua foto
tentando prever o que haverá
daqui pra frente

...em vão.

fico buscando em teus olhos
explicação pra reagires
laconicamente

mas não

encontro qualquer justificativa
que caiba na medida
que exige meu coração.


Meu coração rima com teu nome.


Espero que nossas vidas
rimem uma com a outra, também.

Espero que saibamos fazê-lo bem.
mesmo que seja para algum dia

                                                 despedirmo-nos

e procurarmos um emprego
no coração de outro alguém

segunda-feira, 24 de fevereiro de 2014

Olhos de coruja

Teu nome não podia ser mais teu, Amada
dado o tanto que tu tens de encantador.
E tão tremendamente me ponho encantada
que escrevo uns versinhos em teu louvor

não pela roupa que, lolitamente,
encobria-te as mãozinhas de fada
nem pelos cachinhos angelicais
que invadiam tua fronte iluminada

tampouco pela voz que cantava
lagarto, pirilampo, vagalume, sapo-boi
que, embora para sempre em mim habite,
é melodia de um tempo que há muito já se foi.

o que em ti mais me encanta são teus olhos.
teus olhos, teus olhinhos de coruja!
Quiçá meu platonismo irrisório
se acanha e teu humor o sobrepuja

Mas não, Amada, não te amo
e não há uma Roxanne por aqui
o amor que eu te tinha era doce.
E, assim como teu olhar, eu vi partir.

Lembro-me bem: em tempos idos,
muito que teus lábios quis beijar
tivesse a Menina não aparecido,
o que nos aconteceria, sabe lá

mas o fato é que o tempo fez
as coisas acontecerem como é sabido
depois, o tempo foi-se de vez
e nos encontramos qual velhos desconhecidos

decerto emocionei-me: foi tão lindo!
deu-me nova vontade de teatrar.
ao ver-te ali, corujinha de olhos rindo,
dei-me conta do tempo que ainda há


Disponível para o que eu queira viver
cantar, compor, sorrir, chorar
seja num palco ou não, mas a me ver
mudando sempre e mais o foco do meu olhar

quarta-feira, 19 de fevereiro de 2014

O amor começa

se Paulo Mendes Campos me permite (http://www.releituras.com/i_eleonora_pmcampos.asp)...

O amor começa. No meio fio, por exemplo, numa terça feira de sol escaldante, depois de uma aula de teatro e algum debate; começa em cafés ajeitadinhos, diferentes das praças tão bucólicas nas quais termina; lentamente, no meio do cigarro que ele traga ou que ela esmaga no cinzeiro, repleta de “isso vai te fazer mal”; na doçura da aurora tropical, depois de uma noite votada à alegria que veio pra ficar; e começa o amor no enlace das mãos já na fila do cinema, antes mesmo de o filme começar, porque as mãos sabem dos começos antes mesmo de eles começarem; na insônia dos braços luminosos de um envolvendo o outro; e começa nas sorveterias, com as caldas de chocolate sujando os dedos, as bocas, as roupas; mecanicamente no elevador que para, como se a queda de energia dissesse “beijem-se!” a um tímido quase casal; na epifania da lindíssima pretensão dos bigodes; nas ligas, nas cintas, nos brincos e nas silabadas femininas; quando a alma decide desbravar as províncias da Ásia, onde o amor não pode ser nada além de amor, o amor pode começar; na necessidade da simplicidade simplesmente; no sábado, depois de três goles salvadores de água de coco à beira do mar; no filho tantas vezes semeado, quase vingado por alguns dias, mas que ainda não floresceu, abrindo páginas de possibilidades a serem escritas entre as cores e o bom cheiro de uma só flor; em apartamentos refrigerados, atapetados, aturdidos de delicadezas, onde há mais encanto que encanto; e o amor começa na purpurina do carnaval, caindo bem perceptível no beijo de ir e vir; em salas esmaltadas com sonho, suor e planos; nos roteiros da vida para a vida, na barca, no trem, no ônibus, ida e volta de nada para nada, em casinhas de sala e quarto conjugados o amor se eriça e prossegue; no inferno o amor começa e faz dele o paraíso; na honestidade o amor se aprofunda; em Brasília pode ser umidade; no Rio, vento forte; em Belo Horizonte, maresia; em São Paulo, dolce far niente; uma carta que se decide enviar, e o amor começa; na descontrolada fantasia da libido; às vezes começa na mesma música que começou um outro amor, com o mesmo drinque, diante dos mesmos cisnes; e às vezes até começa em ouro e diamantes; e começa nos cruzamentos do trânsito caótico do centro da cidade; começa no coração já tantas vezes remendado, e que o médico sentenciou imprestável para o amor, e começa no longo cantar do galo, que já nem se escuta em meio a tanta buzina – mas começa! Na janela que se abre, na janela que se fecha, às vezes o amor começa sem que ninguém dê nada por ele; uma palavra, às vezes sussurrada, e o amor começa; na verdade; no cheiro das flores roubadas da primavera; no calor tão reclamável do verão; no barulho do pisar em folhas secas de outono; nos abraços obrigatórios ao inverno; em todos os lugares o amor começa; a qualquer hora o amor começa, por qualquer motivo o amor começa; talvez até para um dia acabar e recomeçar de novo em todos os lugares e a qualquer minuto o amor começa.

segunda-feira, 17 de fevereiro de 2014

sem revizão

Meu sorriso hoje é mais brilhante do que aqueles sorrisos de propaganda de pasta de dente, embora minha boca esteja fechada.

Meu sorriso hoje não é feito de dentes: meu corpo todo sorri por dentro, exibe seu sorriso radiante à minha alma.

Hoje, meu sorriso não se importa se o cara a quem chamam Osho foi um charlatão, nem se distorceram sua imagem, porque só me importa a coerência que eu encontro entre o que esse homem pregou e o que eu sou inclinada a acreditar.

Porque só me importa o fato de fazer muito sentido essa história de termos que plantar felicidade no instante de agora para termos felicidade no instante seguinte.

Não me importa que haja uma corrente de nostalgia e pesar incutida na minha mente tentando me fazer acreditar que essa corrente é intrínseca a mim porque eu já descobri que tenho certeza que posso romper sozinha com essa e tantas outras correntes que tentam me amarrar longe de mim.

Não me importa que na noite passada eu tenha sonhado, literalmente, com o chamado capiroto, apesar de não acreditar em quaisquer demônios, e não me importa também aquele outro sonho que passou longe de ser um pesadelo (mas mexeu comigo bem mais do que qualquer pesadelo mexeria).

Porque ontem eu fui naquele centro Hare Krishna que eu me prometo ir há tanto tempo. Porque hoje eu finalmente achei o filme de 120mm da Bencini que eu herdei da vovó, e quem me vendeu foi uma dona que não se chama Graça à toa. Porque hoje eu fui lá saber como faço para registrar meus poemas e meus sonhos ganharam um pouquinho mais de gosto de palpável. Porque meu pai me deu presentes que eu adorei e seu carinho foi materializado em saia e bolsa. Porque a voz de meu pai me dizendo, antes de atravessarmos a rua, "você é uma boa filha" encheu de lágrimas a retina do meu coração e me presenteou muito mais que a saia e a bolsa.

Porque hoje eu conheci uma escola maravilhosa e vários sonhos renasceram no meu seio, e porque hoje eu levei duas horas para chegar em casa, sendo que talvez nem sequer consiga a vaga que eu quero naquele minicurso, mas nada disso importa.

Só me importa o que une todas as fés: só o Amor e a simples possibilidade do Amor importam.

domingo, 16 de fevereiro de 2014

Aperto

Não me entendo.
(Ai, sentença tantas vezes proferida!)
Durmo grata,
desperto enlouquecida.

Não sinto sua falta.
Minha mente me engana,
como me ensina Osho.

Sinto falta de qualquer coisa que sempre me fez falta
Desde quando nós ainda éramos um laço
(perdoe-me o clichê, é o cansaço...),
Desde quando nem te havia conhecido.
Sinto falta desde que tenho sido
desse pedaço de luz que por vezes me invade
acalanta
e aquece.

Mas logo depois se esvai...
Desde sempre se esvai...
É como ser criança e, andando pela rua, perder-me da mão de meu pai...

Me bate esse desespero da consciência de estar sozinha
Mesmo em meio à tanta gente que a meu lado caminha
E esse aperto, até suponho, talvez forme parte da vida,
E apanho, resignada, já me dando por vencida.

Pia ao longe o passarinho pousado na árvore que mora na minha janela
Não seria mais
nem menos feliz sem ela
ou com as asas do passarinho
(que, afinal, também voa sozinho)

A centelha que busco vive cá dentro
Há que mergulhar em mim para saber
Há que chorar ou sorrir?
Há que ser.

-

 Só vivendo pra (escre)ver os próximos capítulos....
 Beijos de longe (por causa da faringite),
 Zanni


                                                                                   

segunda-feira, 10 de fevereiro de 2014

Caju

Acho que ontem sofri catarse vendo Cazuza.

Obviamente, não o cantor. Mas o espetáculo (maravilhosamente) dirigido por João Fonseca que teria me deixado rigorosamente semelhante a um urso panda caso eu não fosse meticulosa na hora de comprar um bom rímel à prova d'água. Chorei copiosamente a peça inteira.

No início, confesso, fiquei um pouco triste porque já tinha decidido invadir o camarim e declarar minha tietagem ao Emilio Dantas. Só que não foi ele que fez o Cazuza ontem. Confesso: não me lembro o nome do moço que fez. Vi de relance num papel grudado à porta do Theatro Net Rio: Bruno-alguma-coisa. Seja qual for o sobrenome, o cara DES-TRU-IU. A semelhança da voz e dos trejeitos era algo de impressionar. Digo o mesmo sobre os atores que encarnaram o Ney Matogrosso e o Frejat.

Não me lembro de ter purgado tanta coisa desde que assisti Valente, aquela animação da Disney sobre uma princesa ruiva que não quer se casar. Favor não me julgar. Grata.

Juntei tanta coisa... Juntei a minha própria vida com a vida daquele cara que deixou tantas músicas lindas pra gente se embalar no próprio colo. Juntei o texto em que Bordieu fala sobre capital cultural e sobre como as escolas acabam sendo o lugar responsável por manter (e aumentar!) desigualdades sociais embora se proponham a ser o avesso disso à minha indignação acomodada quanto aos preços muy salgados do teatro musical (e da arte em geral) que se faz no Brasil.

Juntei a explicação do Boal no "Teatro do Oprimido e outras poéticas políticas" sobre como e porque a tragédia grega provoca catarse à tudo o que eu senti na pele: a harmatia (única impureza do herói trágico) do Cazuza - aquele instinto auto-destrutivo que ele trazia em si -, anagnorisis (quando o herói admite sua impureza a fim de que o público o perdoe) - para mim, foi quando Cazuza disse que o único mal que ele pode causar é a ele mesmo. E que o sex and drive dele não tem nenhum rock'n'roll. A gente se compadece de uma forma indescritível. E isso tudo, é claro, graças à empatia, a identificação absoluta, o se por no lugar do personagem, o dar-se conta de que tudo aquilo poderia acontecer consigo próprio pelo simples fato de tudo ser tão verossímil (afinal, ali é baseado em vida real: não se trata de ficção) e sermos todos humanos.



Juntei o que um professor de Teoria da Literatura disse uma vez - "a gente é muito esquisito. Passa perfume, sai de casa, senta numa poltrona e fica assistindo pessoas que a gente nem conhece dizerem coisas que foram ensaiadas e ainda aplaude no final pra mostrar que gostou" - com toda a fé que eu deposito na capacidade da arte de transformar vidas e mundos.

Sabe, a vida, no final das contas, é uma merda. A gente ta vulnerável à doenças, vícios, caminhos tortuosos, desafios intransponíveis, obstáculos barrando nossos sonhos, preconceitos, grosserias, humilhações, inseguranças e ignorância. Mas se refizermos as contas com calma, até que dá para levar tudo numa boa, dependendo da ótica que você escolher para enxergar a vida. 

Juntei o fim do meu namoro - ferida ainda com um pedacinho resistindo em carne viva - com meus pés melados de água salgada e areia numa fuga ilícita e não planejada à praia. Me juntei com o mar, com a lua quase cheia e as poucas estrelas que a poluição me deixa ver. Lembrei de amores antigos, lembrei de possíveis novos amores, lembrei da minha infância e do meu futuro.

E no fim, tive aquela sensação maravilhosa de estar no caminho certo.

domingo, 9 de fevereiro de 2014

À caminho da felicidade escandalosa

O lado ruim de já ter sido plenamente feliz é não conseguir me conformar à meia felicidade. O lado ruim de terminar um namoro é ficar me questionando se esta foi mesmo a decisão mais acertada. O lado bom do sábado à noite é que tudo pode acontecer.

Confesso que saí de casa mal intencionada. Comprometida apenas com a ideia de me divertir terrivelmente. A fim de fazer tudo o que não me interessa(va) nem um pouco desde quando tinha lá meus 15 anos ou menos: ficar levemente embriagada, dançar sem qualquer pudor, beijar com afã desesperado alguém que nunca tivesse visto na vida.

E foi o que fiz. Passei meu batom vermelho e me dirigi ao paraíso: um lugar onde só toca mpb. Mas antes, lembrei que o rastro que meu Alvedrio deixou em mim é como um perfume francês: forte demais. Invadiu meus poros e agora faz parte do meu sangue. Mas dessa vez, lembrei do lado mais positivo desse rastro: minha vida segue parecendo um filme.

Por isso mesmo foi que conheci um moço que faz cinema. Um sujeito estranho na barba, nos olhos, no gosto de sal, e mais, embora não tenha tocado Oswaldo Montenegro - uma pena, aliás. Primeiro, conheci seus olhos. Assim, à distância. Fitei seu olhar fitando a mim. E então, houve um joguinho irresistível de desviar de olhares falsamente tímidos.  Sempre à distância. Um diálogo mudo e sempre à distância. Coisa de cinema. Sempre na levada da música que embalasse cada instante. Sempre parecendo que a vida era um eterno dançar e flertar. 

O flerte é uma prática indispensável à felicidade escandalosa. E aqui resgato Baudelaire: o importante é embriagar-nos do que quer que seja. No caso do flerte, não importa com quem ou com o que flertamos. O importante é que haja recíproca. Ontem, flertei com o espelho, com o batom vermelho, com a música brasileira, com dois copinhos de caipirinha, com meu corpo desenhando danças improvisadas pelo espaço, com o próprio flerte e com o moço do cinema. E todos flertaram comigo, de volta. E foi só por isso que a noite passada foi mágica: flertei comigo. E flertei comigo, de volta. Uma recíproca encerrada em si mesma. Protótipo de felicidade-escândalo.

É claro que nada do que aconteceu ontem me assegura a felicidade derradeira (algo assegura?), mas já não importa. Na verdade, nada do que aconteceu me assegura nada. Mas tampouco isso importa. O que importa é que percebi à tempo que nada vai dar certo a quem não se apaixonar perdidamente por si mesmo.


sexta-feira, 7 de fevereiro de 2014

Baudelairando

...e acabou-se de repente o meu mundo cor-de-rosa.
Só agora me dei conta do quanto fui corajosa.
Decerto que houve um rompante - coisa que ninguém espera -
e nada foi como era antes: abriram a jaula da fera.

Disse à mim frente ao espelho: "só e louca, eis-me aqui".
Rabugenta como um velho, nada gostei do que vi.
Eram lágrimas pesadas, me desciam rumo ao chão.
Se quedavam estateladas, tal como meu coração.

Tomou-me o desespero que é meu velho conhecido.
Disse que me deixaria quando fosse convencido
de que a vida vale à pena, que há justificativa
pra aturar tanto problema, pra buscar uma saída

Acontece que a certeza, essa fé, essa razão,
não alcança quem só reza mas não vive com paixão
Há que estar apaixonado, embriagado, isso sim.
Mas talvez não do jeito errado: talvez apenas por mim.

terça-feira, 4 de fevereiro de 2014

hueco

particularmente,
vai tudo muito bem
exceto essa saudade
de estar saudosa por alguém




domingo, 2 de fevereiro de 2014

Tatiar

Ontem, a fofíssima da Supertatiana disse que fica ouvindo mil vezes as músicas que eu jogo por aí, daí eu resolvi fazer isso aqui pra ela.

Sei que às vezes é difícil
entender que a vida
não é tão difícil
quanto parece ser

Sei que desespera
quando o tempo te atropela
e você nem leu
o que queria ler

sei que dá vontade até
de ser outra pessoa
quando nota, a vida voa
e você nem viu

sei que não resolve
essa canção enquanto chove
mas ela é feita pra você
ouvir bem mais de mil

vezes
pra ver se acerta os teus revezes
pra ser um hino que conduz
o teu caminho até a luz

tateando no escuro
pouco aprendo sobre mim
mas se eu desço do muro
lido melhor com meus fins

meditando em pleno breu
Tati anda sob o sol
sonhos parecem com os meus
lua parece um farol

sei que é tentador
fugir com o circo
e, por favor, conte comigo,
que é difícil se equilibrar

nessa corda bamba
que é a vida
sem trapézio e sem saída
que não seja improvisar

saiba que nenhuma opinião
é derradeira
e que a fé só é verdadeira
se te tira o frio

e que todo mundo ta aqui
é pra prender
e não dizer se você
já reencarnou bem mais de mil

vezes
pra ver se acerta os teus revezes
pra ser um hino que conduz
o teu caminho até a luz,

até a luz,
até a luz

quarta-feira, 29 de janeiro de 2014

frágil

Nesta noite interrompida
Pelo sol que hoje se ergueu
Uma quimera enraivecida
invadiu os sonhos meus

Respondeu ao meu relato
a amiga sem piscar:
os sonhos dizem um fato
- tu tens medo de arriscar

Da moça a me interpelar:
Seu falar me confundiu
Tudo rápido demais
e num instante sumiu

-
O ciúme é uma pedra de gelo que se aloja na nossa garganta. Comprime as cordas vocais. Desacelera todo o metabolismo. Nos deixa frios. Desconfiados. Os olhos são atentos, mas nada se enxerga, de fato. Isso porque o ciúme, quando muito grande, se espalha por todo o corpo e congela o cérebro. Desfunciona toda a nossa capacidade de sinapse. Em linguagem vulgar, tornamo-nos burros. Incapazes de reagir à coisas cotidianas que acontecem a um palmo do nariz.

O ciúme é uma doença autoimune.

E a única forma de destruí-lo é com um clichê: através de um severo aquecimento do coração, o calor se espalha pelo corpo e o organismo recobra sua capacidade motora, seu poder de raciocínio, sua fala espontânea e o brilho no olhar.

-

Eu tentei. Juro que tentei. Tenho tentado entender o que se passa dentro de mim, mas não consigo. Não sei por onde. Não sei quais descaminhos tenho que traçar até tirar de mim tudo o que não sou eu. Não chamaria de ciúme. Não tenho motivo para enciumar-me. Não me arrependo de nada do que fiz ou do que não fiz. E sei que fiz valer o meu amor enquanto existiu paixão. Portanto, sei que o que sinto também não é remorso.

Acho que o nome disso é solidão.


Mas não tem a ver com não ter ninguém a meu lado. Tem a ver com eu mesma não estar comigo.

domingo, 26 de janeiro de 2014

Cíclica

Era final de período quando nos conhecemos. Antes mesmo de lo nuestro virar namoro, vivemos aquele amasso memorável no sofá da casa do teu amigo. Lembro que antes de ele ir dormir, estávamos naquele mesmo sofá, comportadíssimas, assistindo A Invenção de Hugo Cabret. Não terminamos de ver o filme, e eu jamais havia ouvido falar nele desde então. E hoje, cá estou eu num sofá, novamente fitando A Invenção de Hugo Cabret e, novamente, não há a menor pretensão de terminar de ver esse filme. No momento, aguardo apenas minha amiga encontrar a primeira temporada de New Girl para assistirmos.

É final de período agora também, mas, apesar do sofá e da sexta feira, não haverá qualquer amasso nesta noite. Nada de amasso, nada de Hugo Cabret. Só duas amigas assistindo uma série leve e divertidíssima entre pizza, Hershey's heteronormativos, uma york shire chamada Lucy e comentários sobre aquele cara que nem beijava tão bem assim. 

Talvez só eu no mundo percebesse as coincidências tão sutis dessa situação. Mas o que me chama atenção mesmo é o quanto a vida é cíclica. Esse jeito da minha história se escrever sempre sem dar ponto sem nó nunca para de me fascinar.

Isso me remete àquela noite mágica da formatura da Guta. Dancei a noite inteira, cheia de champanhe e amor por aquele lugar que outrora havia sido cenário de uma noite tão tristonha. Hoje, como naquela noite, me sinto feliz por não ser mais a menininha frágil que tanto se deixou abater por aquela ressaca amorosa tantas vezes mencionada em bebedeiras e madrugadas sob a nobre companhia de Álvaro de Campos... Não sou Jess Day chorando copiosamente por lembrar do babaca do Spencer enquanto assiste Dirty Dancing. Se é pra ser Jess Day, sou Jess Day imitando um pato na pista de dança de uma festa de casamento, absolutamente imune ao destrutivo medo do ridículo.

Decerto chorei e sofri pela nossa despedida, meu bem. Você sabe... Sofreu e chorou também. Eu vi. E compreendo. Era um filme tão bonito que dava vontade de ser para sempre elenco dele, e nunca mais fazer nada além de cantar para você e beijar sua boca. Mas uma atriz precisa saber se desapegar de um papel. E o filme acabou.

Na maior parte do tempo eu tenho lidado bem com essa informação. Mas sinto sua falta na hora de dormir sem cafuné, na hora de ficar bestando na Letras ao invés de ir te visitar no estágio, na hora de acordar sem sms de bom dia, abrir uma garrafa de rosca ou de esperar o 711 sozinha no ponto depois da aula. Mas aprendi tanto contigo que seria traiçoeiro deixar a tristeza me impedir de fazer jus aos aprendizados. Não vou mais sofrer por trás do batom vermelho. Eu mereço mais sorrisos gritados. E você também.

Lembrei de algumas coisas que aconteceram no futuro.

Amanhã, vou errar o lado da General Roca que me levaria mais rápido até a minha casa. Vou ter que parar quase no Batista Shepard para me dar conta de que estou no caminho errado. E então vou concluir, pela milésima vez em 20 anos, no meu melhor jeito clichê de ser, que preciso me perder no geográfico para me encontrar no existencial. Preciso me perder no mundo para me encontrar num (outro) grande amor. 

terça-feira, 21 de janeiro de 2014

Gratidão

Essa carta é para a Tábata, que quando soube que meu namoro terminou disse: “ah, não, Zanni! Eu leio seu blog!”. Então, esse texto é para deixar bem claro que a poesia e a beleza sempre vão encontrar portas abertas aqui, independente do que estiver acontecendo na minha vida e no mundo.Dedico à Tábata, mas remeto à outra pessoa:


Laisa,

O último fim de semana teve muitos momentos de profunda tristeza, embora eu tenha rido bastante, também. Amigos são parte muito importante da vida, né? Bem, fiquei triste por causa da minha indecisão momentânea sobre tudo o que você já sabe, mas, principalmente, por ter agido de maneira tão rude com você. Não tinha esse direito, você não merecia isso. Sei que já recebi minhas desculpas, mas me desculpe, mais uma vez. Me descontrolei. Mas você me surpreendeu mais uma vez, me ensinando como passar por cima do orgulho e das mágoas e ser grande, ser adulta de um jeito bom, ser madura. Teu colo foi imprescindível. Você foi de uma grandiosidade absurda desde que eu me lembre, mas hoje foi emocionante. E escrevo esta carta para dizer algumas coisas que me fugiram no calor do momento.

Não permita que o escuro e as chuvas te ponham medo e te façam sentir pequena. Você é imensa, do tamanho de deus! Deixe o escuro ser a divindade que vai te ensinar a lidar com teus medos e, quando não der, deixe o relâmpago iluminar teu caminho. E curta o som que o trovão faz, combinado com as gotas de chuva batendo contra o seu rosto.

Confesso que ainda me intriga a falta de uma explicação lógica para o fim de uma história tão bonita. Mas, por hora, pensar que nem tudo na vida precisa de uma explicação lógica me basta. Soubemos viver a beleza que a vida nos possibilitou, e soubemos, embora tendo passado por uma turbulência, reconhecer que chegou a hora do ponto final.

Não, nós não seremos boas amigas. Não é para você que eu vou correr quando a vontade de fazer teatro for absurda, e nem é a mim que você vai recorrer quando não estiver mais aguentando estudar português. Mas é para você que eu vou sorrir quando, daqui a alguns anos, nos encontrarmos na plateia (quiçá no palco) de alguma montagem incrível de uma peça do Chico, as duas com filho pequeno (que criança tem que aprender desde pequena o que é bom!) e coração tranquilo. Amor do lado. Sorriso no rosto.

Mais de vez me flagrei assistindo uma história em que o casal rompe o relacionamento de uma maneira bizarramente leve e bonita, e dizendo, inconformada: “isso nunca aconteceria na vida real!”. Pois acontece. Aconteceu comigo. Ah, você sabe! Você estava lá! Ainda bem.

Prometi (digo, jurei juradinho) tentar não sofrer com receio de prometer não sofrer e não conseguir cumprir, mas agora sei que consigo. Sabe, chorei no ônibus a caminho de casa. Mas chorei sem peso, que nem choro quando ouço uma música que acho bonita. Porque é exatamente isso que sinto: toda vez, daqui pra frente, em que eu lembrar do que a gente viveu, meu olho vai encher d’água, de emoção transbordando, que não dá pra conter. Porque nossa história é uma das músicas mais lindas que alguém já sonhou em escrever. Mas toda música tem seu fim. Ainda bem. Porque aí a gente pode sair pela vida praticando o que aprendeu.


Com amor alvedriado,
Luísa

segunda-feira, 20 de janeiro de 2014

Portuñol

(estudo para canção)

Casi 24 horas lejos de casa
Quizás casi 20 años lejos de mí
Já nem sei há quanto tempo voo sem asas
Nem há quanto tempo o riso não me sorri

Sé muy bien porque todo eso me pasa
Sei que eu fui rude e já me arrependi
Pero al menor de los miedos mi voz se calla
Temo cometer errores que ya cometí

Pergunto: cadê o beijo que sempre encaixa?
Cadê a coragem que me alvedriou?
Cadê as canções, o sexo, cadê a raça?
Será que o nosso longa encurtou?

Era comédia romântica e virou drama
Minha professora bem que me avisou:
"Estudia pa' la evaluación de esa semana
No olvides de ejercitar transposición"

Quisiera decirte que no importa que pase,
Si hay un rumbo nuestro o si eso se acabó
Pero quisiera decirlo personalmente
Para que não se duvide desse amor

No me- no me conozco
como me ha dicho un ángel más viejo
no re- no reconozco
a esta chica del espejo

ya no me reconozco
ni en mis viejas fotografías
quizás
quizás Narciso se reconocería

sábado, 11 de janeiro de 2014

Registros cotidianos

Tem aqui no blog a etiqueta "fotografia", mas eu quase nunca posto nada com essa tag. E como nos últimos dias brinquei um pouquinho com a minha Nikonzinha amada aqui dentro de casa, mesmo, eis o resultado:


As analógicas liiiindas de morrer que herdei da vovó. <3

obs: se alguém souber onde no Rio de Janeiro eu compro filmes de 120mm por um preço bacana, fico agradecida.

Eu sendo poser com a Koroll II + minha parede amada


 Marani modelando


Respectivamente, Cachorrão e Bob - já velhos de guerra - pegando um solzinho

As plantas da mamãe. Queria que desse pra sentir o cheiro da arruda e do alecrim.

(foco na tartaruga-grama que a Marani come)

Meu incenso favorito...


 ...acendendo....

...aceso. (:   sdds manicure
Esse incenso foi o pano de fundo de uma meditação boa como eu não vivenciava há tempos. O mantra foi wahe guru, e eu cheguei a sentir realmente uma alteração física, como se meu corpo de fato estivesse banhado pela maravilhosa luz que o mantra invoca. A numerologia me indica esse mantra pra entrar em equilíbrio comigo mesma. E olha, vou te dizer: funcionou. Foram 15 minutos de êxtase.

A janela mais maravilhosa desse Brasil - a do meu quarto, evidentemente. Usei sem querer o auxiliar de panorâmica, mas acabou ficando bem legal. *-*

Acho a fotografia interessante por ter o poder de eternizar momentos e até sensações que não vão poder ser experienciadas novamente da mesma maneira que já foi um dia (para mais informações, favor ouvir "Como uma onda no mar", do Lulu). Fotografo como desenho: sem técnica nem pretensão ne-nhu-ma, apenas porque me dá prazer.

Vejo a fotografia sempre como uma espécie de autorretrato. É absurda a quantidade de coisas que ficam implícitas sobre alguém se olharmos o que essa pessoa escolhe fotografar. É pensar o seguinte: se seus olhos tivessem zoom, no que eles focalizariam? Isso é a fotografia. É uma máquina de congelar o tempo. É o exercício de estar presente. 

.
Beijos congelados!

quinta-feira, 9 de janeiro de 2014

2ª chamada - Sociologia da Educação

Isso é insano.

A gente lê e não tem tempo de pensar sobre o que leu: outra leitura me atropela antes que eu pense. Antes que eu bote o nariz pra fora de casa e diga “ei, estranho! Li um livro muito bom esses dias, gostaria de te indicar”. E mesmo nas raras vezes que nos obrigamos a ter esse tempo, dificilmente haverá alguém – estranho ou conhecido – disposto a jogar umas duas horas “fora” numa conversa sem objetivos.

Para isso, é necessário matar aula. Dormir tarde. Fazer cara feia pra ninguém chegar perto. Só aí então temos direito ao silêncio. À solidão saudável. À quietude.

Porque, durante as férias, fins de semana e feriados, tanta coisa nos obriga a sair de casa e sorrir sem os olhos, tantas fotos pedem para ser tiradas, tanta felicidade pede para ser exibida, tantas risadas precisam sair de nós depois de um longo período estudando num sistema maçante, que não temos tempo de ficar sozinhos. Não temos tempo de brincar de sério com o espelho. Nem tempo de rir pro espelho, que é o que torna brincar de sério uma brincadeira.

Só rimos pro espelho pra ver se fica bem na foto; se fica bem pros outros, olhando, acreditarem que estamos felizes.

Não temos tempo nem de saber se estamos felizes!

É insano!                     

Não posso dizer a quem eu amo que não quero vê-los no fim de semana sem magoá-los a menos que diga que vou fazer outra coisa. “Não vou à oficina de teatro porque vou ao piquenique”, ou “não vou ao piquenique porque tenho que estudar”. Aí sim. É necessário que me ocupe. Mas ninguém vai ouvir “não vou ao piquenique nem à oficina, e nem vou estudar porque não consigo. Vou ficar sozinha em casa pensando no que eu quero. Em quem eu sou. No quanto eu posso. Desculpa, mas fica pra próxima”. Não digo isso sem ver caras feias. É inconcebível ficar sozinho fazendo nada por escolha própria.

Porque não estamos acostumados a pessoas que se sentem bem sozinhas, consigo mesmas. Não tivemos tempo para acostumar.

É insano ter que escrever quatro páginas para resumir uma apostila sobre a vida de Durkheim. É insano que eu seja obrigada e não convencida a ler esse tipo de coisa. É insano porque não é isso que meus dedos querem escrever. Sociologia da educação é incrível, mas não é nisso que eu tenho conseguido pensar. O que é insano porque trabalhos têm prazos de entrega.

É insano que passando do prazo isso comprometa minha nota, como se um número medisse o valor do meu saber. É mais insano ainda que sempre tenha sido assim.

Eu quero saber é o que Durkheim tem a dizer sobre isso tudo.

E isso tudo não tem nada a ver com facebook nem twitter nem qualquer rede social esquizofrenizante que ainda venham a inventar. Essas plataformas só pioram o estrago. O vírus ta no seio dessa sociedade maluca, corrida, que exige que a gente esteja em atividade o tempo inteiro e permite uma média de seis horas de sono por noite para nos prepararmos para um mercado de trabalho que muito se assemelha ao inferno.

O problema não ta nem na correria... O problema ta em como lidamos com ela e em como não lidamos com nós mesmos nem com os outros.

Quando paramos de nos conhecer? Será que algum dia já nos conhecemos?

Não sei de muitas coisas.

Só sei que esse texto que eu acabei de cuspir na cara de quem estiver lendo agora é bem mais sincero do que o meu trabalho de sociologia.

E eu devo passar com louvor em sociologia.

Mas não devia. Não tenho coragem de mergulhar na loucura que é essa sociedade. Tampouco tenho coragem de me isolar dela.

E "tudo o que importa" é que eu terminei a prova a tempo.
(Pff).

quarta-feira, 8 de janeiro de 2014

Secretária eletrônica

O menino digita oito números aleatórios e espera enquanto o telefone chama. Atende uma voz feminina, mecanicamente:
- Alô?
- Fala pra ela, moça! Fala que eu to precisando ficar sozinho, sambar no escuro, cantar pra dentro. E olha que já faz tempo... Preciso nem lembrar que existe mais gente no mundo, pensar em quem eu sou, no que eu quero, no quanto eu posso. Fala que eu fiquei magoado desde a primeira vez que ela reagiu ao meu encantamento com um livro como se fosse uma grande besteira. Fala que não é besteira! Fala que não adianta nada ser apegado ao desapego. Fala que eu to tentando entender isso... Explica que algumas coisas tem valor não por custarem noventa moedas, mas porque foi difícil juntar noventa moedas havendo tantos outros gastos mais urgentes. Fala que eu vou defender o que fez parte do meu passado com unhas e dentes porque foi isso que me fez ser quem eu sou. Fala que eu não vou ficar feliz com vários quase-dez se tirar cinco e setenta e cinco em uma prova, e deixar duas questões em branco na outra. Faz ela entender que não vou ficar contente enquanto não for bom em tudo. Fala que é quase insuportavelmente difícil essa batalha que eu travei contra o meu ego. Fala, moço! Fala tudo e não a deixe ir embora porque eu não sei falar sem fazer drama. Fala do seu jeito porque deve ser melhor que o meu. Fala porque eu não to sabendo mais falar.

Ouviu-se o som taxativo do bocal do telefone batendo na base. A moça foi. Apaixonou-se pelo amor do menino e foi correndo, desesperada, sem saber pra onde. Sem saber com quem devia falar. Contou o que ouvira em poucas palavras, à sua cândida maneira, a todas as pessoas que encontrou na rua. Assim, tinha certeza, aquelas poucas palavras que resumiam todas as tantas palavras que um menino desconhecido lhe chorara ao telefone, chegariam aos ouvidos da misteriosa menina-alvo
.

Mas o menino não sabia desse ímpeto. Sentiu-se até mais sozinho do que antes. Quando percebeu que não havia mais ninguém lhe ouvindo, chorou, chorou e chorou. E dormiu três noites seguidas de tanta tristeza.